segunda-feira, 24 de agosto de 2015

DO VÍCIO

No advento do infortúnio ótico,
Por onde nem o vento trespassa e geme,
Inda uma vida última teme
A este ser de um espectro exótico.

De modo que, até mesmo o psicótico,
Distante da realidade, treme;
Vislumbra o ópio e o navio sem leme,
E chora, num mar caudaloso e caótico.

E qual é a forma viva que afronta e vence,
Além d'Aquele que deveras ama,
E que torna ordem o que fora caótico?!

Enfrenta, então, quem por Ele clama,
E vence o vício, sem que seja ou pense
Ser enclausurado pelos narcóticos.
Fábio Rezende

ABIÓTICA VIVA

Na urbana concretude, a demência
É fartura. E este poderio sarcástico
Chega, enfim, a tornar-se um dos clássicos
Da miscigenação das aparências.


Sou um transeunte desta latência;
Não a Freudiana; mas, algo qu'é drástico,
Uma fase em que, qual um elástico,
Contrai e expande as incongruências.



Os saudáveis e os loucos, sem juízo,
Caminham tortos e eu metabolizo
O plástico, o aço, o enxofre e o carbono.



E, enquanto eu tento manter a saúde,
Ira e radiação vêm, amiúde,
Da sintética cidade sem sono.
Fábio Rezende

terça-feira, 11 de agosto de 2015

FATÍDICO

Andava por outeiros incomuns;
Envolto em brumas densas e silentes,
Daquelas que não vemos normalmente,
Com a fome de dez dias de jejum.

E, longe, vi a silhueta de algum
Bípede, caminhando lentamente;
Pensei: - São projeções da minha mente!
Mas, temi, em meus neurônios; um a um!...

Então, estático, gritei: - Quem és?
E, além do timbre do silêncio, nada
Ouvia ecoar no nevoeiro.

Por trás de tais contornos, vi os pés
De mais gente (triste). Vi pás e enxadas;
E notei que a sombra era meu coveiro.
Fábio Rezende


quinta-feira, 6 de agosto de 2015

AUGUSTO DOS ANJOS

Enquanto outros haviam mentido,
Estavas a falar sobre parasitas,
E sobre criptas, sob a forma mais bonita
De poemas óbvios e indefinidos.

Um poeta pouco compreendido;
Que dizia as verdades não ditas,
Poesias sobre morte. Malditas;
Augusto. Excêntrico? Pouco lido.

Semelhante a um nobre troglodita,
De escrita rica, que inda grita...
Do além desta vida e desta sorte.

Nascerá, porventura, um poeta
De letras certas, como um profeta
Avesso, que, em vida, viveu a morte?!
Fábio Rezende

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

PARA QUE NÃO TEMAS

Haverá, aqui, muitas e muitas glórias;
És, e serás, por um longo tempo, jovem,
Não faças a vida triste; nem que provem
Que há pouca bondade na história.

Tu terás, e tens, nas ótimas memórias
Motivos que te alegram e comovem;
Tempos, que mudam tudo, não absorvem,
Nem podem lhe apagar a trajetória.

Cada ansiedade tem sentido;
E, tu, tens sentido elevado nível
Da força que procrastina a vitória.

Sei que versos têm um poder incrível;
Se lidos como um decreto. Lidos

Na condição desta dedicatória.
Fábio Rezende

quinta-feira, 16 de julho de 2015

 De tudo que admiro, que desejo, que anelo;
 A Ti, guardei nos átrios da divina
 Esperança. Acima das leis e das doutrinas
 Tu vives, sem cartilha, do que é belo.

Mesmo ao homem que te fere com cutelo,
 És a eficaz – e infalível – lamparina;
 És o alimento, o nutriente; a vitamina,
 E um abrigo suntuoso, qual um castelo.

Ai dos homens que te exilam, nua;
 Dos que te trancam casa afora, na rua,
 Que repudiam Tua glória eterna.

Mas, mesmo a eles, perdoas; pois conheces,
 E sabes que Te invocarão nas preces;
 E Tu te aproximarás: com paz; materna.
Fábio Rezende

terça-feira, 14 de julho de 2015

POTESTATEM

Por ti, quantas foram as guerras e quantas
Vezes se perdeu o controle, e a paz, e a calma?
E quantos venderam corpos? Quantas almas
Foram ceifadas como pobres plantas?!

Falo contigo! Olhe-me! Espanta
Saber que thanatus come na palma
Das tuas mãos, portadoras dos traumas
Castigando os seres que encantas?

Ao teu paladar, agrada a ganância,
És presente desde a tenra infância,
Qual ânsia por requintado cardápio.

Ora! Quem dera fosses mais distante!
Uma província (menos importante),
Não este significante larápio.

Fábio Rezende

sexta-feira, 10 de julho de 2015

SIMULATIO

Rainha do mundo, de idiossincrasias
Vãs e desprezíveis como a imundície;
Falsa; tens somente a superfície,
Pois, ter essência, tu não poderias.

Alimenta-te do que te alimentaria;
Se fosses realmente viva e fugisse
De ti mesma, por irregular planície
Do mundo criado por sua mania.

O cego, a ti, profere bajulações mil,
Em sintonia com todo o vazio
Do que jamais te chamaria.

Tu, te denominas: Admirada,
E chega a acreditar que és amada,
Mas, fostes batizada de Hipocrisia.
Fábio Rezende

quinta-feira, 9 de julho de 2015

DEVORADOR

Tempo; devorador de "hojes", invisível,
Que, enquanto é futuro, é dilatado,
Que torna-se curto, quando passado,
Na frialdade do irreversível.

O grito mais forte será inaudível,
Nossos passos sempre serão levados,
Para um destino comum e gravado,
No espaço escuro e insensível.

Levará cada gota de saúde,
Dormiremos em querer, amiúde,
De olhos eternamente fechados.

E este implacável devorador,
Aos póstumos do pobre escritor,
No tempo exato, fará finados.
Fábio Rezende

SINGULAR

Os séculos lutam, de forma reticente,
Por uma compreensão do Teu significado,
Para conceberem Teu futuro e Teu passado,
Numa abstração concreta do presente.

Analogamente, Moisés ergueu a serpente
No deserto, como fora crucificado
Jesus, e quem O enxerga será curado,
De mazelas ocultas; internamente.

Longe de um déspota; de um tirano,
Aos deletérios deleites mundanos,
Sobrepôs magnânima proposta.

Homens têm líderes restritos - humanos,
Sábios seguem-Te, Arcano e Soberano,
Na Singularidade de todas as respostas.
Fábio Rezende